Localizado no edifício do antigo Convento de Churubusco, o sítio mantém um patrimônio cultural que abriga mais de 500 anos de história no mesmo espaço, combinando histórias pré-hispânica, colonial, a independência e a história do passado revolucionário do México. Em seu acervo estão cerca de trinta ex-votos, que serão documentados pelo Projeto Ex-votos do México em março de 2015. As informações e suporte são de Raymundo Nicolás Alva Zavala, que trabalhou no MNI por doze anos.















ICONOGRAFIA E PERCEPÇÃO VISUAL

Este expressivo retablo é datado de 1920. O ex-voto foi confeccionado em placa metálica fina, chapada. A cena é dividida em três representações que formam uma narrativa constituída de imagens e descrição; nota-se ao centro, na parte superior da imagem, San Nicolas em ascensão, envolto em resplendor; no plano central há elementos que representam o cenário da época em que aconteceu a situação relatada, como os veículos, a arquitetura e a vestimenta. As construções em tonalidades verdes e amarelas evidenciam uma larga rua onde circulam homens a pé, um carro e uma carroça guiada por um animal.
Na extremidade da direita é possível observar a presença de duas figuras na porta da casa, um homem deitado com a cabeça levemente erguida, coberto por um lençol branco e uma mulher de expressão severa, coberta por vestes pretas, onde apenas a face está aparente. Na parte de baixo da cena observa-se a descrição do fato ocorrido: “En el Jacal del Valle en 1920 Magdalena Santoyo viendo a su hijo Tomás muy enfermo invoco al Milagroso San Nicolas y conseguió el alivio.”

A pintura retrata uma paisagem natural, integrada por diversos elementos fitomorfos, tais como os montes ao fundo na lateral esquerda, que estão em tonalidade verde escura, aparentando áreas cobertas por vegetação; três árvores com folhagem verde claro e graduações em outras tonalidades de verde ainda mais claros, das quais pode-se ver o tronco em tonalidade marrom escuro com graduações de verde claro; o conjunto de construções que aparecem em toda a composição forma uma cadeia com quatro compartimentos visíveis, ilustrada pela palavra “carcel” pintada na parte superior direita da instituição. Logo abaixo da inscrição há um portão reforçado, com largas barras na horizontal e na vertical, resguardado à direita por um vigia de carnação branca e com finos traços e bigode, usando fardamento e chapéu em tonalidade azul, sapatos pretos e segurando junto ao corpo uma arma do tipo baioneta.
À esquerda do portão se encontra uma mulher de pé, aparentemente visitante, possuindo carnação branca, trajando um longo vestido em tonalidade verde e um véu na tonalidade azul que se estende da cabeça à altura dos quadris, deixando somente a face a mostra. Com sua mão direita ela segura uma pequena cesta; no canto superior esquerdo, há uma formação de nuvens brancas, de onde é possível ver San Nicolas ajoelhado, de carnação branca, segurando uma cruz, a observar a mulher. Abaixo, a legenda que diz: “En el Monte el 24 de Septiembre de 1918 J Dolores Quintana fue preso y se (…) con la pena de muerte su esposa invocó al Milagroso San Nicolas y el (…) salio libre.”

Análise iconográfica
Ex-voto do século XX documentado no Museu Nacional das Intervenções, no México. Vemos o desenho, feito a óleo sobre lâmina, de um homem e uma mulher ajoelhados diante da imagem da Virgem da Soledade.
À frente de uma cruz, a imagem flutua acima do casal em uma aura acinzentada. A mulher segura um bebê, veste um véu em tonalidade preta e um avental em tonalidade roxa escura. O homem, por seu turno, veste blusa roxa, calça preta e sapatos. Ambos estão em uma sala de paredes azuladas e piso de cor terrosa. Abaixo do desenho, a legenda do retablo traz: “En Febrero del ano de 1882 estando Marcelino Toscano enfermo de grabedad aclamo su esposa y el á la Virgen de la Soledad para su salud le dedicaron este retablo de recuerdo¹”.
Análise iconológica
Nesse retábulo, Nossa Senhora da Soledade está representada ao centro, para onde se direcionam os olhares do casal. Trata-se de Marcelino e sua esposa, que se curvam como sinal de respeito, confiança e fé ao Santo de devoção pela graça alcançada: a cura de uma grave enfermidade. Segundo Scarano (2004) “a maior parte dos ex-votos dá notícias precárias, informações de leigos sobre os males que afligiam o miraculado” e diagnósticos mais precisos eram dados apenas quando era “feito por médicos” ou “quando se tratava de doença conhecida e difundida no local, ou de epidemias”.
Portanto, “gravemente enfermo” é uma explicação comum a muitos ex-votos pintados. Mas, se o retablo nos faz conhecer a cura: a Virgem foi capaz de sanar o mal que adoecia Marcelino. Ainda de acordo com Scarano (2004), “a impotência do ser humano, com precário poder diante de tantos males, assinala que seu relacionamento com os Céus é de pura dependência.” Daí o motivo do casal recorrer à proteção da Virgem. A inclusão do bebê na pintura dá maior desafogo a encenação, pois a convalescença de Marcelino significa que a criança poderá crescer com um pai.
¹ Em fevereiro de 1882, enquanto Marcelino Toscano estava gravemente doente, sua esposa e ele aclamavam a Virgen de la Soledad por sua saúde, dedicaram-lhe este retábulo em memória.
Referências bibliográficas
SCARANO, Julita. Fé e milagre: ex-votos pintados em madeira: séculos XVIII e
XIX. Edusp, 2004.
Por Maria Clara Oliveira – Assistente de Pesquisa – FAPESP